Adriano
Benayon * – 30.09.2013
A
presidente da Republica mantém a tradição de muitos predecessores, com
discursos aparentemente nacionalistas, enquanto diariamente trata a soberania e
o desenvolvimento do País como coisas descartáveis.
2.
Ela denunciou o que foi mostrado por Assange e, depois, por Snowden
e Greenwald: o governo dos EUA, suas agências e empresas apropriam-se de
informações econômicas, estratégicas e até das das pessoas físicas de todos os
países sem meios de impedi-lo.
3. A
presidente disse que fará proposta para estabelecer um marco civil
multilateral para a governança e uso da internet, em nível mundial, visando a
“efetiva proteção dos dados". Essa proposta não tem chance alguma de
ser adotada, mesmo porque os EUA não aceitam regras internacionais
que se sobreponham às leis deles.
4. O
jornalista Fernando Rodrigues foi ao ponto: “Dilma faria
melhor se
buscasse equipar o Brasil contra ataques cibernéticos. A presidente faz o oposto. Engavetou
um projeto de Política Nacional de Inteligência que cria diretrizes para o
Estado brasileiro se prevenir de ações de espionagem. O texto está pronto e parado, no
Planalto, desde novembro de 2010.”
5. Em ótimo artigo, “O
Discurso e a Prática” Paulo Passarinho, âncora do Faixa Livre
da Bandeirante, recorda ter Assange apontado que China,
Inglaterra, França, Alemanha e Rússia, entre outros, têm investido
pesadamente nessa área estratégica e defende que o Brasil adote sistema de criptografia
de tecnologia nacional.
6. Passarinho comenta: “Mas
nossa realidade está muito distante dessa possibilidade. Graça Foster, a
presidente da Petrobrás, por exemplo, declarou que a criptografia
usada na empresa é de empresas americanas, porque não existem companhias brasileiras
que prestem esse tipo de serviço. Snowden denunciou que a criptografia
fornecida por empresas privadas norte-americanas é propositalmente falha e têm
as chamadas “portas dos fundos”, para que a NSA possa driblar
seus códigos e acessar os dados.”
7. Pior:
após o discurso no palco da ONU, Dilma dirigiu-se a executivos de 300
grandes bancos e empresas transnacionais, em seminário sobre oportunidades de
investimento no Brasil, promovido pelo Goldman Sachs, banco líder da oligarquia
financeira.
8. Pediu mais
investimentos estrangeiros no petróleo e no programa de privatizações de
portos, aeroportos, rodovias, ferrovias etc. Deseja, inclusive,
“a capacidade de gestão” dos estrangeiros.
9. Diz Passarinho: “O
show de subserviência aos gringos foi total. Lembrou que “risco
jurídico no Brasil não existe”, procurando destacar que ‘se tem
um país que respeita contratos é o Brasil. E disso nos orgulhamos’.
É evidente que a presidente não se referia à Constituição, diariamente
desrespeitada, especialmente no que tange aos direitos fundamentais dos
brasileiros, por exemplo, aos direitos sociais.”
10. Faz tempo que Dilma cede
aos carteis mundiais. Consolidou a destruição do Estado, intensificada a partir
de Collor, conforme o modelo imposto pelos saqueadores: o Estado desmonta suas
estruturas, sucateia sua experiência administrativa e afasta seus quadros
competentes.
11.
Assim, diz-se que o Estado brasileiro é incapaz de fazer qualquer coisa,
e então ele só faz editais para concessões dos serviços e das atividades
que lhe competem, um método que custa caríssimo ao País, mas arranja dinheiro,
por exemplo, para as campanhas eleitorais.
12. Seria incorreto atribuir
a Dilma toda a responsabilidade pelo descalabro a que o Brasil foi empurrado,
pois a coisa vem de longe. Acontece, desde janeiro de 1955, através dos
favorecimentos propiciados ao capital estrangeiro.
13. Aí foi dada a
partida para chegar-se à presente e avassaladora desnacionalização da
economia e sua desindustrialização. Também à ascendência do poder econômico
estrangeiro nas eleições e na política, envolvendo todos os poderes da
República.
14. De certa forma,
Dilma segue os passos de Juscelino Kubitschek, que jogou para a plateia,
“rompendo com o FMI”, após entregar o mercado brasileiro, a entre
outras, à indústria automotora transnacional, até hoje a maior sugadora dos
brasileiros.
15. Se as atuais
instituições brasileiras e os que as pilotam tivessem compromisso com a Nação,
deveriam repudiar as privatizações criminosa e corruptamente realizadas, desde
Collor e do notório FHC, em lugar de irem pelo mesmo caminho.
16. Esses crimes, que
surripiaram da União e dos Estados patrimônios incalculáveis e avaliáveis, só
no imediato, em dezenas de trilhões de reais, e ainda custaram centenas
de bilhões de reais, foram “justificados” até por tribunais
superiores, apesar das flagrantes ilegalidades, sob a alegação de que a
receita dos leilões serviria para reduzir a dívida pública.
17. Sim, a mesma dívida que,
após a Constituição de 1988, já fez a União despender mais de 11 trilhões de
reais, e, ainda assim, cresce sem parar. Sim, a dívida causada pelo
modelo da entrega dos mercados às empresas transnacionais.
18. Só que, durante os oito
anos da gerência de FHC - auge das privatizações - a dívida
mobiliária federal interna cresceu de R$ 65,6 bilhões de reais para R$ 841
bilhões (12,8 vezes).
19. No mesmo período
(dezembro de 1994 a dezembro de 2002), a dívida externa foi de US$ 73,6 bilhões
para US$ 212 bilhões.
20.
Nos oito anos de Lula a dívida mobiliária interna federal subiu para R$ 2,3
trilhões (2,7 vezes) e chegou a R$ 2,8 trilhões após dois anos de Dilma, no
final de 2012.
21.
Em 2013 o déficit de conta corrente vai para US$ 90 bilhões (em 2012 foi
U$ 54,2 bilhões), repetindo o filme de n outras crises causadas pelas
transferências das transnacionais.
22.
Ora, no exato momento em que o País afunda sob a desnacionalização, o governo
quer intensificá-la. A submissão aos diktats do poder mundial manifesta-se
agora com o petróleo e obriga os que se interessam pela sobrevivência do País,
a lutar para sustar o leilão do campo de Libra, marcado para 21 deste mês.
23.
As reservas desse campo (estimadas em 90% do total das reservas provadas do
País) dão a medida desse escandaloso leilão, mas não deveriam fazer esquecer
outro deste ano, que é imperioso anular: a 13ª rodada, na
qual os carteis internacionais do petróleo adquiram o grosso dos blocos. Nessa
levam tudo, já que o marco legal dessa rodada é a lei 9.478, da época de FHC,
que os governos petistas não se interessaram em revogar.
24.
Lula apenas tomou a iniciativa da Lei 12.351/2010, que instituiu regras
diferentes só para o pré-sal, embora aquém do que exige o interesse nacional.
25. O
Eng. Paulo Metri citou dados da ANP, de 2001, segundo os quais é 65% a
média do que cabe aos países exportadores em óleo equivalente, nos contratos de
partilha. Venezuela, Colômbia e Noruega exigem retorno próximo a 90%.
26. Já o Eng. Fernando
Siqueira mostrou que o edital da ANP determina a partilha em função dos
preços no mercado mundial e do volume da produção, não garantindo
sequer o suposto mínimo de 41,65% para o País.
27.
Ilustrativa do absurdo do próximo leilão de Libra, foi esta resposta de Graça
Foster, presidente da Petrobrás, ao jornal Valor: “Quando se fala em
30% de Libra, fico muito satisfeita. Custa R$ 4,5 bilhões. Mas a Petrobras sabe
fazer, conhece cada centímetro desse poço de 6.036 metros de Libra que ela
perfurou. ... o objetivo do governo é levar recursos para educação
...”
28. Foster confirma o óbvio,
pois a Petrobrás descobriu o campo e já extraiu óleo do pré-sal. Ora, país
nenhum leiloa áreas cujo potencial de produção já é conhecido. Os 30% que cabem
à Petrobrás são determinados pela Lei 12.351, operadora necessária. Assim, as
estrangeiras levam petróleo sem trabalhar.
29. Confessando que o
objetivo do governo é financeiro, o absurdo fica maior, pois a produção
só se iniciará daqui a anos, nada gerando a curto prazo.
30. As verbas para a
educação têm aumentado muito. Porém, são mal aplicadas: grande
parte vai para estabelecimentos privados, a maioria dos quais vem sendo
adquirida por grupos estrangeiros
31. Além disso, não há
necessidade alguma de captar os recursos do bônus (15 bilhões de dólares), uma
migalha diante do serviço da dívida programado para 2014: 1,2 trilhão de reais.
32. Para melhorar as
finanças públicas, basta diminuir os juros dos títulos do Tesouro. Dois pontos
percentuais de redução nas taxas representam, em apenas um ano, muito
mais que os 35 bilhões reais do bônus do petróleo, que é só um empréstimo
oneroso: o dinheiro só entra uma vez e depois vai saindo.
33. A
exploração do petróleo por companhias estrangeiras não cria elos positivos para
a economia, já que elas não contratam empresas nem técnicos brasileiros para os
equipamentos e serviços de exploração.
34.
Não só o óleo, mas também o grosso dos ganhos vai para o exterior, o que torna
pequeno o reinvestimento em capital fixo no País, que perde também a
oportunidade de desenvolver mais tecnologia na área.
35. A
abundância de divisas com a exportação dá enorme poder financeiro às companhias
exploradoras, incrementando ainda mais fator a desnacionalização e a
desindustrialização do País. A valorização da taxa de câmbio incentiva as
importações de maior valor agregado Tudo isso significa
subdesenvolvimento programado.
37.
Poucos parlamentares tomaram iniciativas contrárias ao leilão de Libra: projeto
de decreto-legislativo do senador Requião e mais três; ação popular de
parlamentares do PSOL e senador Pedro Simon. Mais de 80 organizações
protocolizaram carta no Palácio do Planalto pedindo sustar o leilão. Movimentos
sociais acamparam em frente à Petrobrás.
38.
Tudo isso é louvável, mas é pouco. Para ter algum resultado, os poderes
da República teriam de perceber forte pressão de massa, suficiente para
equilibrar as pressões que sofrem permanentemente dos interesses antinacionais.
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